Jim Kelly (1946 – 2013)


 
Morreu Jim Kelly, astro do cinema de ação dos anos 1970, que ficou famoso pelo papel do campeão americano de artes marciais do clássico “Operação Dragão”, filme estrelado por Bruce Lee. Ele morreu no sábado (29/6), aos 67 anos, de causas não reveladas.
 
Jim Kelly foi o primeiro astro negro do cinema de kung fu, e costuma ser apontado como um dos responsáveis pela popularização do gênero nos EUA, durante a década de 1970. Seu vistoso cabelo afro, magnetismo sexual e presença dominante em cena tornaram-se icônicos, e são a inspiração assumida de obras que remetem ao período, como a atual série animada “Black Dynamite”.
 
 
Operação Dragão
 
Nascido em 5 de maio de 1946, James Milton “Jim” “the Dragon” Kelly não vinha do gueto urbano e violento do Bronx, como muitos de seus personagens. Ele nasceu em Paris, no interior do Kentucky, e cresceu na ensolarada cidade de San Diego, na Califórnia. Atleta desde jovem, ganhou uma bolsa de estudos da Universidade de Louisville para participar de seu time de futebol, que abandonou em protesto contra o tratamento racista dado aos jogadores negros.
 
Ele começou a treinar karatê na metade dos anos 1960, virou faixa preta e se tornou professor de artes marciais. Após vencer seu quarto campeonato internacional de karatê em 1971, na categoria peso médio, abriu seu próprio dojo. Um de seus primeiros alunos foi o ator Calvin Lockhart (“Aconteceu Outra Vez”), que queria entrar em forma para um thriller criminal chamado “Melinda” (1972).
 
 
Operação Dragão, ao lado de Bruce Lee
 
“Melinda” foi produzido durante o auge da blaxploitation, gênero que ficou conhecido por suas tramas de ação, trilha soul e elenco negro, mas também por suas raízes independentes. Cineastas e atores negros trabalhavam pelo mínimo e entregavam o máximo de entretenimento para o público dos cinemas dos bairros de periferia.
 
Kelly acabou aparecendo nas locações para ver como seu aluno tinha progredido, mas sua presença imponente não passou despercebida pelo diretor Hugh A. Robertson, o primeiro negro a ser indicado a um Oscar técnico (Melhor Edição, por “Perdidos na Noite”). Como era típico dos filmes do gênero, ele acabou escalado de improviso para uma cena. E foi assim que o mestre karateca estreou no cinema, numa pequena participação como instrutor de artes marciais no filme de 1972.
 
 
Jones, o Faixa Preta, com Gloria Hendry
 
Não precisou mais para que recebesse o convite que mudou sua vida. Os produtores queriam um astro negro para coestrelar “Operação Dragão” (Enter the Dragon, 1973), filme que juntaria kung fu e espionagem. E Kelly tinha o perfil exato. Ele daria vida a Williams, um americano arrogante e sensual, que competiria ao lado de Bruce Lee num torneio de artes marciais organizado por uma organização sinistra.
 
A locação – uma fortaleza numa ilha asiática – e o vilão pareciam vir de um filme de James Bond. Mas o cinema ainda não tinha visto nenhum astro como aquele karateca de cabelo afro e costeletas, com o corpo malhado por puro treinamento, e que fazia as mulheres – e até alguns homens – suspirarem. Além de tudo, os roteiristas capricharam em suas frases de efeito. Kelly surgia em cena tão cool quanto Lee podia ser letal.
 
 
Implacáveis Até o Inferno
 
Tudo em sua presença indicava que ele seria um astro. Só que o personagem morria logo no começo da trama. Cedo demais, lamentam os fãs do clássico de ação até hoje. A comoção não passou em branco para o diretor de “Operação Dragão”, Robert Clouse, que resolveu transformar Kelly em protagonista no seu filme seguinte, “Jones, o Faixa Preta” (Black Belt Jones, 1974).
 
“Jones, o Faixa Preta” era puro blaxploitation. A máfia tinha descoberto que um novo centro cívico seria construído no gueto, e decidido comprar todas as propriedades da região para um golpe de especulação imobiliária. Só não conseguia comprar uma propriedade: a escola de karatê de Pop Byrd, um velho amigo de Black Belt Jones. Quando a máfia mata o velho, descobre que a escola está no nome de sua filha, mas antes que possa extorqui-la, o faixa preta surge para acabar com os gângsteres e salvar o dia. Simples assim.
 
 
O Dragão Negro
 
Vieram diversos outros filmes com variações do mesmo tema: dar pau num monte de brancos sem vergonha. Em alguns, Kelly se juntou a outros ícones do cinema blaxploitation, como Jim Brown (“Marte Ataca!”) e Fred Williamson (“Um Drink no Inferno”), gerando obras que ganharam culto, como o sensacional “Implacáveis Até o Inferno” (Three the Hard Way, 1974), no qual tentavam impedir um plano de holocausto racial, levado adiante por supremacistas brancos que criaram uma toxina letal para os negros. O trio também estrelou “Revanche de Sangue” (One Down, Two to Go, 1976), onde enfrentava gângsteres nos bastidores de um torneio de artes marciais.
 
Em 1977, Kelly estrelou “O Dragão Negro” (Black Samurai), começando a parodiar a si mesmo. Seu personagem era um agente da D.R.A.G.O.N., alusão tanto à série de espionagem “O Agente da U.N.C.L.E.” quanto ao fato de ter estrelado “Operação Dragão”. O enredo misturava artes marciais, espionagem internacional e um vilão traficante, que também praticava vudu. Uma loucura de baixo orçamento, tão ruim quanto exótica, que por seu psicodelismo involuntário também virou cult.
 
 
Dimensão Mortal
 
A autoparódia chegou ao auge em “Black Belt Jones 2″, uma versão made in Hong Kong do famoso personagem, que retinha apenas o título e o ator originais, para contar uma trama de espionagem passada do outro lado do mundo. Mais espionagem sem pé nem cabeça – e um vilão com raio de gelo – ameaçaram Kelly em “Dimensão Mortal” (Death Dimension, 1978). Os roteiros se tornavam cada vez mais derivativos, os orçamentos encolhiam. Até que em 1979, após “Mr. No Legs”, o ator pendurou a faixa preta e foi jogar tênis.
 
Bom em tudo que fazia, Kelly se tornou um jogador de tênis bem rankeado no circuito sênior dos EUA.
 
 
Jim Kelly encontra Muhammad Ali
 
Nos anos 1990, ele reapareceu como coadjuvante num par de filmes B sem maiores consequências, voltados ao mercado de home video. Mas soube escolher como fazer sua despedida. Sua última aparição nas telas foi com uma pequena figuração em “Black Ninja”, comédia de ação blaxploitation lançada em 2007, que fazia referência direta ao seu legado como ator.
 
Reverenciado entre a nova geração, ele se tornou muito maior que os filmes B que estrelou. Virou parte da cultura pop. Michael Jai White (“Spawn”), criador do personagem e estrela do filme de 2009 que inspirou a série animada “Black Dynamite”, assumiu: “Em ‘Black Dynamite’, eu copio seu estilo, do afro ao famoso kiai (grio), e espero continuar a honrá-lo com a série”. White também dubla Bushido Brown, personagem da série animada “The Boondocks”, inspirado por “Jones, o Faixa Preta”. Seja por meio de filmes, séries e até mesmo o hip-hop (o grupo Wu Tang Clan cita seus golpes no rap “Da Mystery Of Chessboxin’”), o herói de visual black power e mãos letais continuará vivo e chutando por muito tempo no inconsciente coletivo.
 


Fonte: Pipoca Moderna

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