Emicida e sua nova música polêmica
O rapper paulistano Emicida acabou de lançar o álbum independente O
Glorioso Retorno de Quem Nunca Esteve Aqui. Entre as faixas, levantou
polêmica a batizada de Trepadeira. Como já é possível imaginar pelo
nome, a “trepadeira” é uma mulher que (oh!) faz sexo.
As redes sociais se dividiram. Muita gente criticou o rapper, outras
tantas o defenderam. Emicida emitiu hoje uma nota pública sobre o caso. Segundo o cantor, trata-se de uma história ficcional e,
portanto, as críticas seriam infundadas. Ele menciona que outros
artistas também compuseram e cantaram músicas machistas. Ele tem razão
neste ponto, mas a crítica feita a ele hoje não ignora aquelas feitas no
passado e no presente a todos os outros que produziram discursos
semelhantes. Por isso a primeira justificativa – a de que é apenas
ficção – simplesmente não cola. Não dá mais para falar como se a
produção cultural caísse do céu e se propagasse no vácuo, contrariando
até as leis da física, porque não é assim que funciona. Discursos são
criados a partir de uma realidade opressora (no caso, machista) e
normalizam essa mesma opressão.
Isso não quer dizer que Emicida é o grande culpado pela misoginia no
mundo. Claro que não, mas não dá para “deixar passar” uma letra que
sugere que uma mulher ativa sexualmente – biscate, segundo o autor –
mereça uma surra (Merece era uma surra de espada de São Jorge).
A canção inteira é no sentido de desmerecer a mulher que faz sexo:
Você era o cravo e ela era a rosa,
e cá entre nós gatinha, quem não fica bravo
dando sol e água, e vendo brotar erva daninha.
Chamei de banquete era fim de feira,
estendi tapete mas ela é rueira.
Dei todo amor, tratei como flor,
mas no fim era uma trepadeira.
O recado de Emicida é que não se deve tratar bem (regar, cuidar) uma
mulher trepadeira. Esse discurso é desumanizante, diminuindo a mulher
apenas à vida sexual, desconfiando da dignidade em razão da quantidade
de parceiros, julgando como não confiável uma mulher só porque ela não
se submete a ser o “amuleto da sorte” do personagem (ele também usa a
expressão “trevo de três folhas”).
O músico tentou comparar Trepadeira com uma canção do disco anterior,
Vacilão, em que o personagem não tratava bem uma mulher, saía com
outras, e acabou sozinho. Bom, mais uma vez, basta olhar o nome da
música: Vacilão. Quem vacila é bobo, se deu mal… só. Não existe
julgamento de caráter baseado na vida sexual do tal “vacilão”. Já o
castigo da “trepadeira” não é ficar sozinha – é tomar uma surra.
E isso diz muito sobre como encaramos a sexualidade da mulher.
Fonte: Carta Capital
Comentários
Postar um comentário
Deixe um comentário! É muito importante para nós!