Adolescente negro (por quê seria diferente?) é espancado até a morte em linchamento no Espírito Santo
Por: Por Redação, com Negrobelchior/Carta Capital - de São Paulo
Um adolescente de 17 anos, Alailton Ferreira, foi cercado por um
grupo armado com pedras, barras de ferro e pedaços de madeira. Ele foi
alvo de um espancamento coletivo. Desacordado, o menino foi levado ao
hospital, mas não resistiu e morreu na noite desta terça-feira.
Aos gritos de “mata logo” e de vários xingamentos, o espancamento
aconteceu às margens da BR 101, na tarde do último domingo, no bairro de
Vista da Serra II, cidade de Serra, há cerca de 30km da capital
Vitória, no Espírito Santo. Só depois de duas horas de muita violência, a
Polícia Militar chegou ao local, colocou o jovem na viatura e o levou
até a Unidade de Pronto Atendimento. “Os policiais militares descreveram
no boletim de ocorrência que foi necessário utilizar spray de pimenta
para conter os populares” disse o delegado-chefe do DPJ, Ludogério
Ralff.
O motivo do linchamento foi causado por acusações controversas.
Alguns disseram que o jovem teria tentado estuprar uma mulher. Outros
que ele seria suspeito de tentar roubar uma moto e abusar de uma criança
de 10 anos. Tudo ocorreu no domingo, mas até esta quarta-feira, dia em
que Alailton foi enterrado, não havia qualquer denúncia ou relato de
testemunhas, segundo a Polícia Civil.
O irmão contesta as acusações e diz que o adolescente sofria de
problemas mentais: “Ele chamou a menina, ela se assustou e correu para
chamar a família. Os familiares e vizinhos correram atrás dele. Por isso
as pessoas falaram que ele era estuprador. Se ele quisesse roubar uma
moto, teria feito no próprio bairro, mas ele nem sabe pilotar”. Segundo o
tio do jovem, foi um ato de covardia. “Ele estava com uns problemas de
saúde e ficava assustado com frequência”.
O morador Uelder Santos, 29, em entrevista para um jornal
também colocou as acusações sob suspeita: “Ninguém viu esse tal estupro
ou mesmo noticias da suposta vítima”.
Em entrevista a um jornal, a mãe de Alailton, a doméstica Diva
Suterio Ferreira, 46, disse que o filho teria sido vítima de uma
injustiça.“Ele já foi preso por furto, usava droga, mas não estuprou
ninguém, jamais faria isso”. Cristã, disse que se apega a Deus para
socorrê-la nesse momento difícil: “Meu filho era amado, sonhava
em me dar uma casa. Dizia que queria um quarto para ele, um para mim e
um para irmã. Minha filha, de 11 anos, só chora, tem medo de sair à rua
depois do que aconteceu. Acredito na justiça divina. Peço que essas
pessoas peçam perdão a Deus pelo que fizeram ao meu filho”.
O escritório das Nações Unidas apresentou nesta quinta-feira um
levantamento sobre as taxas de homicídio em que conclui que as Américas
são as regiões mais violentas do planeta. O Brasil está entre países
mais violentos. Das 30 cidades mais violentas do planeta, 11 são
brasileiras. Segundo a publicação, Maceió é a quinta cidade do mundo com
mais homicídios por cada 100 mil habitantes. A cidade de Vitória do
Espírito Santo, vizinha ao local onde Alailton foi assassinado por
populares, é a 14ª da lista mundial.
Não gosto de suposições, por isso fico nas perguntas: qual seria o
resultado de uma amostragem com o recorte racial das vítimas desses
homicídios em toda América? Teríamos uma proporção parecida com a média
brasileira, que aponta 70% de vítimas negras?
Não sei se Alailton estuprou alguém. Era mulher feita ou uma criança
de 10 anos? Ambos os crimes são gravíssimos. Mesmo que tenha sido uma
“apenas” uma tentativa ou ainda que o jovem tivesse problemas mentais,
sem dúvida caberia alguma punição. E a Lei prevê. Mas jamais um
linchamento. Jamais!
E pior: nada leva a crer que houve de fato o crime. Aliás, ao que
parece (não sou investigador, nem gostaria), ele teria sim sido “vítima
de uma injustiça”, como disse a mãe doméstica.
O fato de ser um menino negro teria sido um elemento potencializador
do ódio coletivo e da precipitação de um julgamento instantâneo –
acusação, julgamento, condenação e execução: Foi ele! Pega ele! Só pode
ter sido ele!?
E se fosse um menino branco, a história teria tais requintes de crueldade e terminaria no cemitério?
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